oiê! esta é a primeira edição de algo novo. sejam bem-vindes à ela — a coluna de música
a partir de hoje, todo começo de semana, pretendo escrever sobre os últimos lançamentos musicais — quer dizer, pelo menos os que eu acho interessantes e que merecem ser escutados por um número maior de pessoas. provavelmente não estarei falando sobre o novo EP de Marcos e Belutti, a não ser que eles lancem algo muito fora da casinha. não vai ter Arthur Aguiar também. quer dizer. nunca diga nunca, né? eu não vou dizer nunca. pelo menos não agora.
eu juro que adoraria ter mais para falar nessa introdução, mas sinceramente, existe algo mais direto do que uma coluna de música? não tem muito o que explicar. você sabe como essas coisas funcionam. “nossa, isabela, ninguém nunca escreveu sobre música antes”. eu sei, e é por isso que estou aqui. o pioneirismo é um dos pilares da eu destruirei vocês. em breve, pretendo inventar a roda. reinventar eu não quero. eu vou fazer pela primeira vez
big thief - double infinity
folk rock, neo-psychedelia, indie rock
espera aí, vocês não gostaram disso? Double Infinity provavelmente é o melhor disco do Big Thief desde… não sei, qualquer disco do Big Thief. por muito tempo, eu tive graves questões com este grupo musical. Big Thief não é uma banda de discos. a sensação é que, uma vez ao ano, Adrianne Lenker escrevia duas músicas muito boas e aí decidia que precisava escrever um álbum inteiro — porque é isso que bandas normalmente fazem. ela pegava o violão, dedilhava qualquer coisa e, trinta minutos, depois, a banda entrava no estúdio e gravava tudo. tudo bem, boa parte de Dragon New Warm Mountain I Believe in You é lindo, mas perceba que eu estou falando “boa parte” aqui. Double Infinity é lindo em sua totalidade.
eu sempre estarei apoiando qualquer mudança de sonoridade em bandas que eu já gosto — porque, sinceramente, eu canso fácil das coisas. e quando saiu o primeiro single, Incomprehensible, eu imediatamente fiquei obcecada; Big Thief quer ser dream pop. os instrumentais do grupo sempre foram meio whatever, de vez em quando um banjo surgindo, mas aqui eles estão ao mesmo tempo mais sujos e mais angelicais — há literalmente um feat. do ícone new age Laraaji. totalmente inesperado, totalmente maravilhoso. e ainda assim, se você aumentasse o bpm do álbum, isso seria um disco punk. você pode acreditar que esses dois conceitos são opostos, mas os melhores discos punk também são angelicais.
Double Infinity é um disco sobre amor — sujo e angelical. tudo que você passa com um amor, tudo que você passa com uma paixão, tudo que vocês falam e deixam de falar. all night all day i could go down on you ou viajar de carro olhando pras árvores e os pássaros e conversando sem nada no rádio. como eu poderia saber naquele momento no que nos tornaríamos? um infinito duplo. escute Double Infinity quando estiver se sentindo parte de algo. se não estiver, tente evitar. talvez dê algum gatilho
destaques: incomprehensible, los angeles, grandmother (feat. laraaji)
james k - friend
downtempo, indietronica
faz tempo que eu não escuto algo parecido com isso — e eu escuto algo parecido com isso o tempo todo. Friend é um disco familiar, mas é mais um irmão do que um amigo. eu apoio e recebo de braços abertos esta nova onda de imitar o que acontecia na música eletrônica da virada de século e trazer para uma nova década. pessoas que cresceram fascinadas com o papel de parede padrão do Windows XP e buscam transformá-lo em ondas sonoras. e sim, eu falo um pouco de Pinkpantheress, mas você já ouviu After? você tem uma relação profunda com a música da Paira? você gosta de Everything But the Girl e da trilha sonora de The Virgin Suicides feita pelo AIR? você precisa ouvir Friend. conselho de amiga
Friend é um disco para escutar de madrugada — e eu já ouvi Playground Love enquanto fumava um cigarro olhando pela janela às quatro da manhã e sei te dizer que esse tipo de música combina muito toda a situação, principalmente se você estiver sofrendo psiquicamente. vozes femininas passeando pelos seus ouvidos, uma produção etérea, uma interpolação de Bôa - Duvet porque é óbvio que sim. você é tão Y2K, amiga. que Deus te abençoe
destaques: days go by, play, hypersoft lovejinx junkdream
titanic - hagen
art pop, art rock
este é o segundo disco do Titanic, dupla mexicana de gênero indefinido composta pela violinista Mabe Fratti e Hector Tosta, ex-membro da La Vida Bohème. quer dizer, acredito que essas duas pessoas possuem sim um gênero, mas Hagen é difícil de explicar; é como se misturassem as canções mais progressivas de Natalia Lafourcade com os discos de rock do Brian Eno nos anos 1970 — um On Some Faraway Beach em língua espanhola. e eu menciono Brian Eno porque realmente parece que o seu espectro ronda esse álbum; é música pop feita por gente que não está necessariamente acostumada a produzir música pop, música pop feita por gente que está metida com música eletroacústica. onde estava a alma de Brian Eno? ele gostava mais dos seus álbuns de música normal ou, se dependesse dele, passaria a vida mexendo em um sintetizador? ele é Roxy Music ou ele é uma colaboração com o Harold Budd? não tem como saber. e eu não quero perguntar pra ele hoje. deve estar fazendo coisas mais importantes
Hagen é uma experiência — e experiências, de vez em quando, podem ser positivas. a sensação é que o disco quer entrar em você. ele quer bater na sua porta e, se você não tocar na chave, ele vai derrubar tudo em seu caminho. isso inclui qualquer porta. não pretendo fazer comparações com Björk, porque mesmo tudo no mundo sendo Björk nada é Björk, mas eu sinto coisas parecidas escutando isso. Hagen é dramático, é teatral, é too much no melhor sentido do termo. eu queria me afogar em Hagen. talvez um dia eu me afogue.
destaques: Lágrima del sol, Libra, La trampa sale
david byrne - who is the sky?
chamber pop, art pop
o idoso David Byrne está de volta — e naquela fase da carreira que todo artista envelhecido sempre passa. você sabe do que eu estou falando; colaborações sem sentido, um disco novo a cada cinco anos com no máximo duas músicas boas, uma mudança abrupta de som que nunca é revisitada, elementos eletrônicos surgindo do nada. talvez tal artista se meta com Broadway; nunca saberemos. e é por isso que Who Is The Sky? me surpreendeu tanto. isso era para ser o disco mais 6.3 da história, mas não. eu gosto da maioria das canções aqui. o que está acontecendo?
o trabalho solo do David Byrne possui um otimismo exacerbado em relação ao presente — é como se eu estivesse em uma sala de aula em 2007 aprendendo sobre diferentes culturas, ou assistindo a novela Geração Brasil e torcendo para o Brasil vencer a Copa do Mundo em casa. é contagiante; eu até começo a acreditar que algo de bom pode acontecer no mundo quando Everybody Laughs começa a tocar. não se engane; não há nada de novo nessas 12 faixas. é só uma música do David Byrne atrás da outra. mas talvez seja exatamente isso que a gente precisa
destaques: the avant garde, i’m an outsider, everybody laughs
ear - the most dear and the future
glitch pop, indietronica
não sei o que está acontecendo na capa e não pretendo perguntar. The Most Dear and The Future nos traz algum tipo de futuro que, tão distante do nosso presente, ainda não pode ser distinguido ou identificado ou constatado. se houvesse um gênero de música simplesmente chamado som, The Most Dear and The Future faria parte dele. de certo modo, isso é música pop, mas é uma música pop deturpada de um jeito quase Xiu Xiu se eles tivessem crescido escutando Crystal Castles ao invés das piores músicas do ZZ Top. acordes dissonantes e skips intencionais e vocais misteriosos. olha pra mim; tem sons nesse disco. escute-os e entenderá. eles são uns queridos, e eles são o futuro.
destaques: real life, theorem, the most dear and the future
outros lançamentos existentes
la dispute — no one was driving the car
post-hardcore, emo
de vez em quando é importante escutar música de homem gritando.
shallowater - god's gonna give you a million dollars
slowcore, alt-country
aqueles discos que daqui a cinco anos você revisita e descobre uma imensidão.
valentim frateschi — estreito
mpb
não quero fazer nenhuma comparação com Tim Bernardes, então não vou falar nada.
saint etienne — international
dance-pop, electronic dance music
eu acho chique quando uma banda dos anos 1990 continua lançando coisas boas até hoje.
fleshwater — 2000: in search of the endless sky
alternative metal, post-hardcore
você é tão Y2K, amiga.
amei as dikas e já salvei tudo pra ouvir. deixo aqui, como oferta, uma recomendação: loser - tame impala
irei escutar as recomendações com carinho, mesmo que eu seja uma das pessoas que não gostou do novo do Big Thief