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eu destruirei vocês #104: pessoas e bonecas de anime
a premiação The Game Awards e discos brasileiros diferentes
não existe prova maior de que videogames são sim arte do que o fato de existir uma premiação dedicada a eleger os melhores do ano nessa arte — tudo bem, seguindo essa lógica basicamente qualquer coisa é arte, mas isso não importa no momento. todos os anos, homens engravatados com gostos desinteressantes & genéricos se reúnem em alguma sala misteriosa de Hollywood/CA para realizar rituais satânicos e, se der tempo, decidir quais serão os indicados ao The Game Awards, a maior premiação de videogames do mundo
mas não ache, por favor, que isso é um evento importante: por mais que o host eterno & mente por trás da premiação Geoff Keighley queira que você leve tudo muito a sério, isso é mais um concurso de popularidade do que qualquer coisa. o público pode votar aqui, e nada que o público pode votar tem qualquer valor. é menos Oscar e mais Grammy: eles jamais premiariam Cruelty Squad como indie do ano, assim como os Grammy nunca, sob hipótese alguma, dariam o prêmio de álbum do ano para um disco experimental de hypnagogic pop do James Ferraro. é só você olhar a lista de melhor jogo do ano
uma pessoa normal pode olhar essa lista e pensar que ela faz sentido, mas qualquer pessoa que jogou mais do que seis games em todo esse ano entende que isso está longe de representar, realmente, o melhor de 2023. o que diabos faz Spider-Man 2 aí? eu joguei o primeiro gamezinho do Homem-Aranha naquela época triste da minha vida em que eu tinha um PS4 e ele nada mais era que uma versão modernizada dos beat ‘em ups — um gênero terrível de jogos que te obriga a não pensar em momento algum da jogatina. se você ousa pensar enquanto joga Spider-Man, o jogo praticamente te pune
e tudo bem, eu tenho certeza que Alan Wake 2 e Baldur's Gate 3 realmente são jogos incríveis, e eu sei que Super Mario Bros. Wonder e o novo Zelda também são, mas existem algumas omissões graves nessa lista. Pikmin 4 é um carro pra não estar nessa lista? Pizza Tower, um dos jogos mais estilosos de todos os tempos, é uma bicicleta? Bomb Rush Cyberfunk é algum tipo de veículo motorizado não-específico? Pseudoregalia é o que, meu Deus? Pseudoregalia é o que? vocês tem medo de qualquer coisa que não seja realista? vocês me enojam. eu vou jogar WORLD OF HORROR e deixar vocês falando com um modelo 3D de uma gostosa
e o pior de tudo é que os caras inventam categorias. eu quero que fique bem claro pras pessoas aqui presentes que não jogam videogames: nenhum desses jogos existe. quer dizer, eles até podem existir, mas é impossível que exista alguém realmente jogando essas coisas. é culpa da bolha em que eu estou incluída, que não se importa com jogos para celular enquanto todo o resto do mundo que não é viciado em games obscuros de WonderSwan Color passa o dia inteiro no Candy Crush e Dots? óbvio que sim. é evidente que sim. mas a minha bolha é muito confortável. não quero sair dela. tem barra da Hershey’s no frigobar, e é só ligar pra recepção que eles me entregam um negroni na hora
por Deus, o que é um Honkai: Star Rail? é como se tivessem pego todos os jogos de anime com mecânicas gacha que existem, misturado em um liquidificador e o que saiu foi isso. esse game é um potinho de sorvete napolitano que você misturou com a colher quando derreteu, transformando-o em uma gosma sem forma definida e com um sabor misterioso. e Monster Hunter Now? pra que eu vou querer um caçador de monstros agora? eu acabei de tomar meu café da manhã, não preciso disso — e muito menos de uma aventura na ilha com a Hello Kitty. é novembro, eu não aguento mais trabalhar. não quero ter que lidar com isso
eu adoro isso. a cada ano que passa, essa categoria se torna mais misteriosa e esotérica pra mim. em certos anos você até conseguia reconhecer um ou dois nomes nessas listas de pessoas — se bobear, até alguém que você acompanha e curte o trabalho! hoje em dia? impossível. eu sou velha. tenho 27 anos na cara e não sei mais do que os jovens gostam. eu sei que eles escutam Xamuel, assistem lives do Orochinho, tomam Monster Mango Loco e adoram praticar misoginia recreativa. se eles assistem Quakcity? como é que eu vou saber?
já que eu não sei o que qualquer uma dessas pessoas — ou bonecas de anime — faz, vou tentar adivinhar única e exclusivamente pelo seu nome e avatar
Ironmouse é uma v-tuber que joga Overwatch e faz piadas sexuais estranhas que deixariam qualquer pessoa normal desconfortável mas seus fãs adoram
PeopleMakeGames é um canal sobre pessoas que fazem games
Quakcity é obviamente um streamer de Minecraft. se ele não for, eu me mato
Spreen é um youtuber que ficou famoso fazendo sorteios de iPhone e hoje em dia faz pegadinhas mal-intencionadas com pessoas aleatórias na rua
Sypherpk joga League of Legends. bom pra ele
eu amo que existe uma categoria melhor jogo que ainda não saiu. um dia eu falo sobre como toda a cultura de hype em cima de videogames é prejudicial à arte como um todo, mas hoje eu não quero. tem jogo do Criciúma daqui a pouco
boa tarde! o texto a seguir vem direto da edição #28 da eu destruirei vocês, lançada no longínquo mês de maio de 2022. a newsletter possuía, nessa época, exatamente 287 inscritos — o que significa que as chances de você ter lido esse texto são pequenas. a não ser que você goste muito de mim
peço desculpas por ter só um texto inédito nessa semana, mas espero que vocês entendam que é novembro. não preciso dizer mais nada. mês que vem é dezembro. olha que completo absurdo.
finalmente uma lista interessante
os dez melhores álbuns da história do Brasil
a sensação que eu tenho é que todo ano, um grupo de jornalistas, músicos e produtores tupiniquins se reúne pra fazer uma nova Lista de Melhores Álbuns Brasileiros de Todos os Tempos — e elas são sempre iguais. Acabou Chorare ou Clube da Esquina em primeiro lugar, algum disco do Chico Buarque no top 5, um do João Gilberto pra preencher a cota bossa nova e 90% do resto da lista sendo composta de diferentes discos de artistas da Tropicália. Nara Leão em 47º. coloca algum do Caetano do final dos anos 1970 lá pela 84ª posição.
é o cânone. aquilo que não pode ser mudado. na visão de quem trabalha com música, nunca nenhum disco vai ser lançado no Brasil que ultrapasse esses aí, e por isso essas listas sempre vão ser a mesma coisa. é tipo o Pelé: mesmo se aparecesse um guri de 5 anos de idade jogando no profissional que fizesse 30 gols por partida, todo mundo ia dizer ah. mas o Pelé era diferente, né. e eu não julgo, faria o mesmo. duvido que esse moleque teria 3 taças de Copa do Mundo. não teve nem tempo de jogar duas Copas ainda
mas aí vem o questionamento: pra que fazer uma lista nova se ela vai ser igual à todas as outras? por isso eu decidi fazer o meu top 10 de melhores álbuns brasileiros de todos os tempos — que na verdade não necessariamente são os meus álbuns favoritos, mas que fazem uma lista muito mais interessante. não gostou da lista? Então peço desculpas. Por favor, não me bate.
10. Raimundo Soldado – Abraçando Você (1980)
feat. o Conjunto Grupo de Ouro, é o melhor da sofrência maranhense. ao menos do que eu conheço. um carimbó/brega com tecladinho, e qualquer canção desses gêneros que tenha tecladinho automaticamente me interessa. tecladinho é um estado de espírito. a letra eu te amo demais/você gosta de mim, no clássico Você gosta de mim, é uma das mais potentes da música brasileira
9. Divergência Socialista – Lilith Lunaire (1990)
post-punk/minimal wave mineiro. que sequência incrível de palavras. metade do álbum parece música pra tocar em um trem fantasma, música de susto, e a outra metade parece Lulu Santos misturado com The Cure, e se isso não te deu vontade de escutar o disco, o problema é todo seu. eles têm uma música chamada Cu de Comunista também. caso você se interesse pelo assunto
8. Os Replicantes – O futuro é vortex (1986)
bah. pior que se tu for ver, o futuro é muito vortex. uma banda gaúcha do gênero Wander Wildner, isso é tipo… surf punk, quase? ah, tem uma música literalmente chamada Surfista calhorda. deve ser isso mesmo. recomendado pra quem gosta de filmes da Troma
7. Marli – Colostro (2005)
boa sorte tentando encontrar esse aqui
6. Raul Seixas, Sérgio Sampaio, Edy Star e Miriam Batucada – Sociedade da Grã-Ordem Kavernista Apresenta Sessão das 10 (1971)
um título que utiliza todas as letras do alfabeto. esse pra mim é o melhor álbum do Raul Seixas, e olha que eu sou uma das poucas pessoas no Brasil com menos de 40 anos de idade que é fã dele. é um disco metade rock/metade samba mas não é samba rock, tem uma diferença aí. é uma dicotomia interessante o fato de ninguém se importar com esse álbum e mesmo assim o artigo sobre ele na Wikipédia ser gigantesco, meu Deus do céu
5. Skank – Cosmotron (2003)
samuel rosa por favor entre na minha casa e componha uma canção sobre solidão inspirada por Beatles. esse álbum é Oasis se Oasis fosse bom, porque eu tenho certeza que nenhum dos Gallagher conseguiria escrever Vou deixar, mas o Samuel Rosa escreveria Wonderwall em uns dois minutos e num xilofone. Dois rios é tipo top 5 maiores músicas da língua portuguesa, e olha que essa língua existe há uns 800 anos
4. Séculos Apaixonados – Roupa linda, figura fantasmagórica (2014)
sophisti-pop carioca! um bando de jovem que escutou Prefab Sprout demais e fez um disco. é música brega com reverb e um pouco de ironia, mas não é uma ironia insuportável, é uma ironia mais palatável. se você gostar disso, recomendo a banda Dorgas, que tem um nome horroroso & também alguns dos membros da Séculos Apaixonados. eles lançaram um álbum em 2013 e é o melhor Animal Collective que o Brasil já produziu
3. Silvinha – Grita coração (1984)
é a Silvinha Splish Splash sim. ela despirocou nos anos 80 e fez um disco bem disco, e essas palavras tem significados diferentes nesse contexto. esse aqui é cheio de grooves, com umas músicas que parecem até abertura de anime, quase um city pop brasileiro (essa última parte é mentira). tem vezes que eu sinto que sou a única no mundo que conhece esse álbum, o que me faz me sentir muito mais legal que as outras pessoas
2. Jocy de Oliveira – A música século XX de Jocy (1959)
uma desconstrução da bossa nova que foi lançada no mesmo ano do Chega de Saudade. esse disco é algo que tu tem que ouvir pra acreditar que realmente existiu, é um negócio muito experimental pro contexto da música popular brasileira da época, com músicas falando sobre suicídio, assaltos e incêndios com uma sonoridade diferente de tudo. eu pago muito pau pra esse álbum e pra Jocy de Oliveira, que é uma pianista super conceituada que foi se meter com música eletroacústica anos depois
1. Video Hits – Registro Sonoro Oficial (2001)
tem um tipo muito específico de pessoa que gosta desse álbum. é aquela pessoa obcecada por Beach Boys, The Zombies, pop psicodélico dos anos 60 em geral e também os dos anos 80 e 90, tipo XTC e Jellyfish. eu sou esse tipo de pessoa. esse álbum é um pouco de Jovem Guarda misturado com power pop, aquelas guitarras meio Weezer e… basicamente, é um álbum pra virgem. escute se nunca transou
criciumenses e habitantes da região carbonífera: eu vou ficar TÃO triste se vocês não forem assistir a peça da minha namorada hoje de noite na Fundação Cultural de Criciúma. é sério. eu conheço todo mundo da cidade que lê isso aqui e eu posso facilmente ficar triste com cada um de vocês. eu não perdoo
vocês que moram fora de Santa Catarina estão morrendo de calor? pelo menos a roupa de vocês seca rápido no sol. aqui vai ser só chuva até terça-feira que vem. se eu for obrigada a repetir looks, a culpa não é minha: é do aquecimento global
o Substack me notificou segunda-feira que estão finalmente trabalhando em uma versão em português da plataforma — e pediram feedback para a versão teste da tradução. exceto que quando você abre o Forms pra mandar o feedback, só tem essas opções
estava lendo um artigo essa semana sobre a data de lançamento do Super Mario Bros. original nos Estados Unidos — que não se sabe até hoje qual é — e cheguei nessa informação incrível. eu quero tanto acreditar na festa de lançamento do NES rolando na Studio 54
o São Caetano até já anunciou que não vai mudar o escudo, mas os novos designs que eles mostraram essa semana são inacreditáveis. contrataram um artista furry e ele fez isso em cinco minutos no Photoshop com as brushes padrão
eu destruirei vocês #104: pessoas e bonecas de anime
Um irmão da fé disponibilizou a discografia de Marli - sétimo lugar no top dos álbuns - no drive.
Aleluia!!!
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https://drive.google.com/drive/u/0/folders/1q57oI7hGfVme5PhPcT8JN5VTIImbXkim
O segundo lugar, por sua vez, lembrou-me do épico Amazonas Kid. Admito que minha capacidade de associação é muito discutível. Mas foi o que me lembrou.
https://www.youtube.com/watch?v=2qbSR4Gd8FQ