o ano é 2024, o The Voice não existe mais e o cenário da música pop passa por um momento de reformulação. as grandes artistas do início dos anos 2010 estão mortas e enterradas — Katy Perry não convence mais ninguém com seus hinos empoderados, Lady Gaga tentou voltar pra música pop e descobriu que não consegue mais empolgar ninguém após anos de Tony Bennett & Bradley Cooper, e Rihanna esqueceu o endereço do estúdio onde gravava suas canções e está impossibilitada de pedir um Uber para finalizar qualquer música nova que tenha escrito.
enquanto isso, uma nova geração está surgindo: Olivia Rodrigo é a estrela pop perfeita para esse mundo dominado pela Disney, Billie Eilish é o mix entre o emo e o pop que donos de gravadoras em meados dos anos 2000 pagariam bilhões para ter, e Sabrina Carpenter é loira. qual o exato nível do potencial da Chappell Roan, da Tate McRae, de uma Addison Rae? não faço ideia! vamos descobrir!
mas sabe qual a diferença primordial entre todas essas artistas e a cantora pensilvaniana Taylor Swift? se você falar mal de qualquer uma delas nas redes sociais, não receberá na sua caixa de correio sequer uma bomba caseira.
THE TORTURED POETS DEPARTMENT, o novo disco de Taylor Swift, foi lançado. desde a última sexta-feira, dia 19 de abril de 2024, pessoas ao redor do mundo estão ouvindo, escutando, dissecando e discutindo o álbum como se ele fosse algo além de um disco pop — sendo que ele é, veja bem, um disco pop. já sabemos que tudo é consumo, mas hoje em dia isso é uma questão de ética. Taylor Swift, Beyoncé, Anitta — essas são figuras impossíveis de serem criticadas sem uma chuva de críticas exatamente porque você criticou elas. e o problema não é o teor da crítica: é a crítica em si. a existência da crítica é o maior pecado possível. Taylor Swift lançou um disco de 31 músicas e se você ousar condenar qualquer aspecto da obra, você está morto
disponível nos sabores baunilha e anthology, THE TORTURED POETS DEPARTMENT, em caixa alta, com uma capa, estética e título vindo diretamente do We Heart It, possui, de fato, 31 músicas. nos últimos anos, Taylor Swift lançou os tais remakes de seus álbuns antigos com uma quantidade tão absurda de faixas bônus que saturou o Spotify Rewind de qualquer pessoa que tenha escutado o disco uma única vez — até agora eu não tenho certeza como essa mulher foi a segundo artista que eu mais escutei no ano passado, mas talvez tenha algo a ver com o 1989 (Taylor’s Version) e o Speak Now (Igualmente Taylor’s Version) possuírem, respectivamente, 21 e 22 faixas cada. essa tática funciona tão bem que só de escutar O DEPARTAMENTO DOS POETAS TORTURADOS em sua totalidade 4 vezes, a loira certamente estará no meu top 5 no final do ano. literalmente culpa minha
mas quando você lança um disco de 31 faixas menos de um ano depois de lançar um outro disco de 23 faixas, o que isso significa? existe alguma chance, matemática, numérica ou artística, de que você se importava com todas essas músicas com a mesma intensidade? cada uma das 31 canções no seu disco foi cuidadosamente concebida, escrita, produzida, mixada, masterizada com todo o carinho que uma canção pop merece? “tudo bem”, você pode retrucar. “são apenas canções pop”. mas se Taylor Swift supostamente é a Joni Mitchell do século XXI, ela precisa ser colocada em um padrão mais alto.
Court and Spark, lançado em janeiro de 1974, possui dez faixas. José Feliciano e Robbie Robertson tocam guitarra no disco. EL DEPARTAMENTO DE POETAS TORTURADOS entrega, logo na primeira faixa, um Post Malone. eu não quero um Post Malone. eu não quero Jack Antonoff. eu preciso de Free Man in Paris
and for a fortnight, there we were. a todo momento, LE DÉPARTEMENT DES POÈTES TORTURÉS, em caixa alta, implora pra você. Taylor Swift faz tudo de propósito. ao mesmo tempo que um departamento de poetas torturados é um conceito breguíssimo, ela tem noção disso — a própria faixa-título deixa explícito que ser um poeta torturado escrevendo poemas & poesias em uma máquina de escrever é chato, irritante, piegas, mas ela também é, então tudo bem. mencionar Dylan Thomas, mencionar Patti Smith, mencionar Chelsea Hotel — brega. mas ela tem noção disso. ela tem noção que o uso do termo nofuckinbody é brega? aí eu não sei.
ela realmente acredita que Charlie Puth deveria ser um artista mais conhecido? talvez. talvez em outra vida, em outra dimensão, em outro universo ela seria a sua Meghan Trainor, sempre com um piano de ragtime, videoclipes simulando uma prom, um pastiche de anos 1950 — mas sem os racistas, que fique bem claro. um golden retriever tatuado? não pode fazer isso com um cachorro. nenhum homem é um golden retriever. talvez nos primeiros três meses de relacionamento sim, mas ele precisa começar a lavar a louça em algum momento. quais raças de cachorro lavam louça? Dylan Thomas limpava o banheiro? talvez em suas noites boas
Taylor Swift constantemente pensa estar em um episódio de Girls, um capítulo de Sex and the City, uma versão moderna de Bridgerton com menos sexo ainda. But Daddy I Love Him provavelmente é inspirada por um dos dois últimos relacionamentos pré-futebol americano da cantora, mas parece mais uma fantasia de perseguição — garotos selvagens? em 2024? nem existe mais isso. todo mundo só escuta The 1975. I Can Fix Him (No Really I Can)? mentira. transformar o love of my life do primeiro verso em um loss of my life ao final da música? você está 5 anos adiantada para o revival da poesia rebloggável de Tumblr, mas está na época certa para fazer sucesso como uma Rupi Kaur instagramável. abra já uma conta com a palavra afetos no username
e além de tudo, poucas coisas me deixaram mais irritada na última semana que o último verso de Clara Bow, a última faixa da versão vanilla de LA TURTURITAJ POETOJ DEPARTO — e tudo bem, talvez isso signifique que eu tenha uma vida relativamente tranquila, mas qualquer menção a você mesma em uma canção é automaticamente merecedora de um putz. não estou querendo dizer que Taylor Swift não merece ser mencionada ao lado de Clara Bow e Stevie Nicks, até porque as duas possuem uma quantidade infinitamente menor de streams no Spotify que a loirinha de 1989, mas veja bem: que coisa brega. a autorreferência é um dos pontos mais baixos que um ser humano pode chegar. Mike Love que o diga
Florida!!!, com três pontos de exclamação, uma Florence e uma máquina, é ótima. infelizmente o jeito mais fácil de uma música me conquistar é colocando uma bateria intensa, forte, pujante em seu refrão — e eu tenho certeza absoluta que o Jack Antonoff, apesar de jurado de morte por mim, tentou me agradar com esse detalhe. faz muito sentido que foi escrita por Taylor e Florence, porque o estilo é totalmente reminiscente do último disco da ruivinha — e talvez eu goste tanto exatamente por não ser uma música da Taylor Swift de 2024. Fresh Out the Slammer possui um refrão gostosinho, e apesar do final, Clara Bow é ok. se você apontasse uma arma na minha cabeça e me pedisse para cantar qualquer música entre as faixas 17 e 31, eu seria assassinada por um motivo muito besta.
DZIAŁ TORTUROWANYCH POETÓW é um disco de Taylor Swift. no momento, ele está com uma nota 77 no Metacritic — um site que misteriosamente é levado a sério por fãs de música pop e gamers de todo o mundo. é medo? é o que? publicações escolhendo a fã mais obcecada da cantora em toda a redação para analisar o disco? um pavor de escolher uma pessoa que não saiba que, sei lá, The Bolter é sobre o segundo ex-namorado mais feio dela? So High School é sobre o ensino médio dela. não existe algo mais cultura hétero do que pensar no ensino médio depois que ele terminou. Taylor Swift quase rodou em química no terceirão, hein. mataremos sua professora se for preciso
de acordo com o meu last.fm, o ano que eu mais escutei Taylor Swift na minha vida foi 2023, com 257 scrobbles. o top 5 de discos mais ouvidos dela é, na sequência, folklore → 1989 → evermore → 1989 (Taylor’s Version) → Red (Taylor’s Version). eu acho que os únicos discos dela que eu nunca escutei são o debut e o Reputation, a não ser a canção Getaway Car, que eu adoro. cardigan é uma das melhores canções folk da década de 2020, nível Adrianne Lenker, eu continuo achando Blank Space uma música pop semi-perfeita, State of Grace parece algo do Teenage Fanclub, You’re on Your Own, Kid sempre me lembra daquela fancam do Messi, a versão de dez minutos de All Too Well é magnífica e é impensável que Style, Wildest Dreams & Out of the Woods foram hits considerando o cenário deplorável da música em 2014.
THE TORTURED POETS DEPARTMENT é um disco pop de 31 músicas sem nenhum single.
just kids. the secret history. on self-respect. ingebord bachmann. my year of rest and relaxation. pottermore. the beauty of the husband. the sims 3: showtime. nobue kawana. my scene. fernanda young. blowup. denise levertov. denise emmer. the marble index. dark academia no pinterest. AO3. pamela des barres. carol. sibylle baier. i know the end. jane austen. valerie and her week of wonders. neko case. portrait of a lady on fire. connie converse. beyond the valley of the dolls. kara jackson. espelho da vida. jeanne dielman, 23 quai du commerce, 1080 bruxelles. bury me at makeout creek. geração 1 de monster high. court and spark
amiga infelizmente ou felizmente eu não tenho a energia pra ouvir 16 músicas da taylor swift em 2024 mesmo sendo boa parte delas sobre matty healy meu canalha de estimação. mas gostei muito de suas palavras!
dito isso vi que você está ouvindo o the great escape!!!! amo esse álbum de paixão. curiosamente a obra que eu acho mais parecida com ele em Vibes é a série succession. a energia "sou muito rico e tenho depressão severa". só que no lugar de orquestras e pianos é overdose de synths porque é sobre ser nouveau riche em 95. os b-sides são alguns dos melhores deles...
e eu só acho que o the great escape funciona tão bem porque existe uma tensão muito primordial acontecendo entre o direcionamento maximalista pop do damon, empanturrado de metais e timbres de teclado casio, e o graham coxon fingindo que não era com ele e tocando como se ele estivesse no dinosaur jr. tem um solo de guitarra atonal em country house!
ao mesmo tempo, é interessante pensar que é o álbum que marca o backlash do público em relação ao blur. não é muito surpreendente dado o quão pouco relatable as músicas são, e que a comparação popular era com pulp e oasis no auge, falando sobre o outro extremo da estratificação social. mas é interessante justamente porque é o que leva ao enorme redirecionamento que é o álbum seguinte deles. era uma banda com algo a provar pro mundo e pra si mesmos!
e talvez sejam essas fontes de tensão criativa que faltam à taylor. se não da parte dos produtores yes-men dela, da parte da fanbase e da mídia? a dupla de álbuns mais aclamados criticamente dela vieram justamente depois de dois álbuns muito mal recebidos. mas agora ela tem a maior echo chamber do mundo e não existe um mundo em que isso possa fazer bem pra arte de alguém, quem dirá pra psiquê dessa pessoa. ...talvez até por isso ela ficou especialmente sentida (creio eu que com razão) com a reação popular ao relacionamento dela com o matty. foi o momento mais recente em que ela bateu nos limites da caixinha em que a echo chamber colocou ela.
gosto muito de blur
isa, eu nunca vou ouvir tudo isso de Taylor Swift na vida, nem 1/10. Então se alguém perguntar minha opinião, eu tô fechado contigo.