caso você não tenha percebido ainda, estamos em 2024. eu sei, pode parecer estranho: desde 2016, meio que todos os anos são sempre iguais e levemente piores que o anterior. às vezes rola uma pandemia, uma eleição presidencial, um novo disco da Olivia Rodrigo — mas o tempo? o tempo sempre continua o mesmo. as coisas acontecem e as coisas vão continuar acontecendo. às vezes eles te jogam alguma coisa pra te entreter. tá rolando Copa América, né. não tô assistindo muito. Divertidamente 2. eu não vi também. Meu Malvado Favorito 4. às vezes meio que tem um milkshake novo no McDonald’s, e ele é dos Minions
eu acho que é impossível retornar ao que éramos. na minha infância de criança reprimida criciumense, minha família constantemente fazia compras no maior supermercado Bistek da cidade. Criciúma tem essa peculiaridade de ter várias redes de supermercado que começaram aqui, foram fundadas nesse terreno, então meio que temos um Giassi enorme, um Angeloni enorme e um Bistek enorme — é como se fosse o quartel-general da franquia. todos esses supermercados também possuem variantes menores, não tão shopping center, sem lojas ao redor ou unidades do Subway tentando tirar o foco daquele hidratante facial Nivea que você veio comprar. são apenas supermercados. o Bistek menor nós chamamos de Bistekinho. o Bistek grande nós chamamos de Bistekão. eu comprava milkshake do Bob’s no Bistekão.
em algum ponto do início da década de 2010, O Grande Bistek passou por uma grande reforma — mais ou menos na mesma época em que O Grande Angeloni foi ampliado e O Grande Giassi foi construído. a era de ouro dos supermercados criciumenses. eu sei como esse Bistek é hoje porque eu sou uma consumidora assídua de tal supermercado: é lá onde eu compro pão d’água, pão de forma e pão integral, caso seja necessário. eu tento muito me lembrar como era o Bistekão antigamente. eu não sei quando ele foi construído, mas tenho quase certeza que nos primeiros anos de minha vida ele não existia. eu penso nele e e eu penso em reformas. um chão de concreto no estacionamento. um homem em cima de uma escada. uma pessoa com um martelo. mas eu lembro perfeitamente do quiosque do Bob’s na saída do supermercado
de acordo com o acervo do site BaresSP.com.br, grande fonte para pesquisas sobre releases publicitários do ramo alimentício dos anos 2000, foi no dia 02 de outubro de 2007 que a marca Bob’s anunciou uma nova e inovadora linha de milkshakes crocantes. em um momento pré-cooptação colonizadora do brasileiríssimo milkshake de Ovomaltine pelo conglomerado estadunidense McDonald’s, a marca fazia sucesso principalmente com esse sabor: mas agora, existia toda uma linha crocante. foi nesse dia, nessa data, nesse momento da história em que surgiram dois sabores que mudariam o mundo: o milkshake de maçã com canela do Bob’s e, novamente, principalmente, o milkshake de banana caramelada do Bob’s. ah… o milkshake de banana caramelada do Bob’s.
o milkshake de banana caramelada do Bob’s era magnífico. um dos grandes feitos da humanidade, essa grande massa homogênea que colocou um homem na lua e um cachorro em uma nave especial. eu posso esquecer o layout de qualquer supermercado, mas o sabor desse milkshake ficará pra sempre em minha memória. eu sinceramente não entendo muito a classificação dele como um milkshake crocante: na minha cabeça ele é quase o oposto. um milkshake mole como — e me perdoe se isso for muito controverso — os milkshakes devem ser. eu sou contra milkshake de Ovomaltine quase por princípio. é como se fosse um milkshake perigoso. flocos de Ovomaltine prontos pra te atacar no momento em que você os coloca no boca. é um milkshake agressivo. a banana caramelada não era assim. você sentia o gosto da banana e do caramelo. havia pedaços de banana de verdade. a vida pode ser tão simples.
o milkshake de banana do McDonald’s me causou uma profunda tristeza. antes fosse uma melancolia. ao menos dela dá pra tirar algo. antes de tudo, é preciso falar que os milkshakes do McDonald’s são em sua grande maioria péssimos: é um grande amontoado de açúcar com alguma farofa não específica. não tem um charme, não é disruptivo, você não sente nada enquanto o consome — é um produto que você adquire quando vai no McDonald’s comer um hamburguer. pedir um milkshake do McDonald’s em um quiosque de shopping é loucura. o quiosque do Bob’s está logo ali. seja uma pessoa normal ao menos uma vez na vida.
mas sempre é tudo sobre branding, não é? o milkshake de banana do McDonald’s nem sequer é de banana — é de BA-NA-NAA. afinal, os minions falam ba-na-naa em seus filmes. os Minions aparecem em Meu Malvado Favorito 4, em breve nos cinemas. criamos uma linha especial de produtos baseada nos seus personagens favoritos. você sabe o nome de todos os Minions? deveria saber. em alguns poucos anos, quando nossa pátria amada Brasil for uma corporocracia, conhecimentos desse tipo irão salvar a sua vida. abra o app e veja se você já atingiu o consumo mensal mínimo de McDonald’s
e quando isso acontecer, sabe quem estará lá na frente, batendo palmas e achando incrível aquela exposição imersiva obrigatória onde eu posso ver a capa original do Harry Potter, usada pelo Harry Potter no filme Harry Potter? usuários de LinkedIn. artistas de IA. publicitários de Instagram, que enlouquecerão com mais essa novidade. nossas contas de banco estão todas vinculadas diretamente ao McDonald’s. eu só preciso pensar para pagar pelos meus produtos. é tudo Neuralink. “essa é a minha méquizice”, dirão esses completos psicopatas. “hoje eu vou no Méqui 1000, aqui em SP. é o evento de lançamento do McFish. eu deixaria todas as corporações do mundo pisarem em mim por um só segundo de conteúdo.” é o nosso futuro. não tem por onde escapar. milkshake de banana do McDonald’s
sabe qual é o negócio? ele é muito ruim. eu nem lembro quantos custou isso, e talvez seja melhor assim — eu poderia facilmente olhar na minha fatura, mas o que isso vai me adiantar? já foi. eu gastei dinheiro com um milkshake do McDonald’s, e a culpa é toda minha. você esperava o que, sinceramente? aqui não é o Bob’s. não tem nada dentro dessa alma. “ah isabela, mas o Bob’s também é um grande corporação” o Bob’s tem alguma coisa. o Bob’s sente. a última vez que eu comi um hamburguer no Bob’s, há uns três anos, ele veio com o queijo gelado. eu não consegui terminar. isso é vida? claro que é. isso é exatamente o propósito da vida. eu senti alguma coisa aquele dia. eu não senti nada com o milkshake de Banana do McDonald’s
é que assim, ele é… eu achei que ele era de paçoca. eu achei, por uns bons minutos, que haviam me entregado o milkshake errado. eu precisei ir atrás do cardápio do McDonald’s para ter certeza que eles não tinham um milkshake de paçoca e assim, ter certeza que eles não me entregaram um milkshake de paçoca. é uma situação muito curiosa. o gosto de banana é mais uma sugestão do que qualquer coisa. você acha que está provando um sabor de banana apenas porque foi lhe dito isso. se me dissessem que era um milkshake de maçã, eu tentaria acreditar. tentaria ao máximo. isso não é um milkshake de banana. é uma fac-símile de banana. um simulacro de banana. um retrato da banana quando jovem.
o que se pode dizer sobre isso? o que se faz quanto a isso? como podemos lutar contra isso? não faço ideia. se eu tivesse alguma resposta, eu não estaria escrevendo uma newsletter bissemanal.
em algum ponto de 2018, o Bob’s tentou voltar com o milkshake de banana — exceto que agora era de banana com chocolate e avelã. não era tão bom. uma coisa não precisa ser três coisas
eu vou falar a real: eu achei essa imagem na minha pasta de downloads e eu não faço a menor ideia de onde ela é. você provavelmente descobre se procurar ela no Google, mas eu não quero fazer isso. hoje eu vou só manter um mistério mesmo
divergimos, pois eu achava o milkshake de ovomaltine maravilhoso. O mini croc complexificava a textura. Também vi a vigilância sanitária fechar três vezes o quiosque do Bob's no aeroporto onde trabalhava e é isso, ele te fazia sentir algo, nem que fosse a adrenalina do perigo.
eu gosto do milkshake de morango do McDonald's pq é dele a minha primeira memória de experimentar algo tão doce e ultraprocessado, quando eu tinha uns 4 anos. o sentimento me marcou tanto que eu compro ele às vezes tentando replicar a sensação, e até funciona, mas só por alguns segundos