e̴̥̺̥͂ù̷̢̫̼̀ ̷̧͙̈́͂͘d̵͖̿̆͗ẽ̸͇̀͘s̸̠̦̠̄̈̒t̷̪̗̉͝ŗ̸̺̝̀̎u̴̥̦͛͜ǐ̸̝͎̎ř̸̜e̷̜̾͝í̶̪͑̋ ̷͎̾͗v̷̼̳͝o̴͙̹͎̐̈́c̸̨̥̗̒ê̶̳͑̈́ͅs̸̗͕̹͂̔͂ ̶͙͇̓̀͐#̴̜̭́͌͝6̴̝̯̈́6̴̮̹̪̂̿͗6̵̰̃
ser criança é incrível porque, nessa fase da vida, você acredita em tudo. um vídeo de fantasma que passou no Ratinho? 100% real. o Ratinho jamais mentiria pra você. uma fita amaldiçoada que você morre se assistir? é verdade. aconteceu isso com o meu amigo Guilherme. seus pais dizendo que se amam e são felizes juntos? ok. não tem porque duvidar. é nessa etapa do crescimento que o seu primo mais velho diz para você que tem uma planta na casa da sua tia que se você tocar, morrerá em seis meses — e você, por curiosidade, toca nela e passa por seis meses do mais puro terror psicológico, acreditando que sua vida vai acabar a qualquer momento. não me perguntem nada; eu estou ótima
e ser uma criança com acesso livre & sem supervisão à internet desde os seis anos de idade me fez ver coisas que eu jamais teria acesso na TV aberta, na TV fechada ou até mesmo em jornais como o Notícias Populares. eu tive o privilégio de poder entrar no assustador.com.br a hora que eu quisesse e ver fotos dos corpos dos Mamonas Assassinas e as mais horripilantes imagens de duendes de toda a internet — e mesmo assim, eu ainda acredito que a internet só me beneficiou a longo prazo. pra você ver o quão chata é a existência infantil em um sítio no meio do nada
boo! desculpa se eu te assustei. eu acreditava piamente na história de Mereana Mordegard Glesgorv porque eu tinha doze anos de idade quando isso apareceu — assim como eu acreditava que o LHC criaria um buraco negro que destruiria toda a humanidade. o lore por trás desse simples vídeo de um homem com um filtro vermelho olhando fixamente para a câmera era simplesmente perfeito: 153 pessoas teriam assistido o vídeo, arrancado seus próprios olhos e os enviado para o escritório principal do YouTube lá nos Estados Unidos. existem inúmeras questões a serem levantadas a partir dessa história, mas eu só quero perguntar uma coisa: será que eles embrulhavam em uma caixa comprada nos Correios ou colocavam os olhos em um envelope mesmo?
por algumas semanas, Mereana Mordegard Glesgorv foi meio que o único assunto em todas as comunidades de orkut que eu fazia parte — isso era uma época pré-Twitter e Instagram, então os memes em geral possuíam uma validade de anos ao invés de apenas alguns femtosegundos. o pessoal da GTA Brasil debatia incessantemente se a história era verdadeira ou não, as personagens de Zoey 101 na ® Agência de Namoro Fake ♥ morriam de medo desse homem em vermelho e reza a lenda que um dos moderadores da Rozen Maiden Brasil realmente enviou seus olhos para o YouTube, mas ninguém tem certeza se isso realmente aconteceu
mas afinal, as pessoas realmente enviaram seus olhos para o YouTube? eu não sei. mas eu peço encarecidamente que ninguém mande seus olhos para a sede da eu destruirei vocês. eu já tenho tralha demais em casa
agora é você que vai morrer em sete dias. algo constante nessa época da internet também eram as correntes — se você não mandar esse texto para vinte pessoas dentro de uma hora, a sua mãe vai explodir ou algo do tipo. e sabe o pior? eu realmente mandava esses textos para todo mundo que eu conhecia e eu tenho certeza que é só por isso que a minha mãe até hoje não explodiu. hoje em dia, esse conceito de correntes segue vivo com os insuportáveis stories de poste uma foto sua alegre ou tenha um agosto terrível que as pessoas mais normais que você conhece não param de repostar
ao menos nos anos 2000, as correntes tinham uma certa sofisticação. era uma época em que a Samara era uma menina de 14 anos — ou melhor, teria se estivesse viva
não se passa uma semana que eu não penso no quão perfeito esse plot twist é. existem filmes de Alfred Hitchcock que não tem metade do poderio narrativo dessa simples frase. ela não tem 14 anos. por que? porque morreu com 13 anos. e o pior de tudo é que o dono do lote ficou rindo por duas horas da menina enquanto ela agonizava e pedia ajuda, o que é um tempo inimaginável para ficar rindo de alguém — normalmente uma coisa desse tipo perderia a graça depois de uns quinze minutos no máximo
mas pelo menos enviando para 20 comunidades, a sua alma está salva — eu só não sei como é feita a checagem para descobrir se você realmente enviou, porém. talvez o dono do lote tenha sentido remorso depois daquelas duas horas de gargalhadas e começou a fazer essa contagem pra ver se sua alma era salva ou algo do tipo — não quero perguntar pra ele também. jamais conversaria com um latifundiário do oeste paranaense, e graças a Deus não faço jornalismo investigativo pra precisar falar com um
ei, por que você não joga esse joguinho aqui? é de labirinto. é bem legal.
toda cópia da ‘eu destruirei vocês’ é personalizada
as anomalias de Super Mario 64
eu gostaria de dizer primeiramente que eu fui uma pioneira: desde o primeiro momento em que eu joguei Super Mario 64 em um emulador mal-otimizado no meu PC com Windows XP em 2007, eu tive a certeza que isso era um jogo de terror.
existe uma atmosfera nesse game que é impossível de ser replicada hoje em dia por qualquer desenvolvedor pelo simples fato de que a humanidade sabe como se faz um jogo em 3D. na época em que Super Mario 64 foi feito, ninguém tinha esse conhecimento. era literalmente uma nova dimensão para se trabalhar, com possibilidades totalmente novas — e é por isso que todo o universo do game, mesmo sendo pequeno, parece tão vasto. a sensação é que você só está vendo uma parte desse mundo. a sensação quando você joga Super Mario 64 é que estão escondendo coisas de você
o castelo da Princesa Peach talvez seja a maior fonte de ansiedade que esse jogo te traz: a geometria desse espaço não faz sentido algum. é uma arquitetura completamente confusa em múltiplos níveis: salas enormes que parecem não ter propósito algum, cômodos inteiros guardando apenas uma grande pintura que você pode entrar, um quarto apenas com espelhos — não tem como uma pessoa viver aqui. um monarca jamais aceitaria condições tão desumanas de moradia
por isso sempre foi questão de tempo até Super Mario 64 passar a ser tratado como o survival horror que realmente é. em 2020, o conceito de icebergs estava no seu ápice entre canais do YouTube de conteúdo duvidoso e jovens curiosos na internet — eu me encaixo na segunda opção. vídeos e mais vídeos sobre as curiosidades mais obscuras possíveis dos desenhos do Adult Swim, sabores de Mountain Dew e coleções diferentes de LEGO que, em sua grande maioria, traziam informações reais. você não duvidaria da existência da Wild Peach Mountain Dew, até porque seria muito estranho alguém inventar um sabor inexistente de um refrigerante. mas o iceberg de Super Mario 64 não era assim
eu considero essa imagem, em toda sua complexidade e plenitude, um dos grandes trabalhos de terror da história da internet — ao menos no mesmo nível de This House Has People in It isso aqui está. poucas coisas podem bater no peito e dizer que foram a gênesis de todo um universo expandido, mas o iceberg de Super Mario 64 pode bradar isso com prioridade. pouca coisa capturou a imaginação da internet de um jeito tão forte quanto essa imagem, e essa é a maior prova de que uma obra de arte realmente tem mérito. ela mudou vidas
tudo bem, existe um exagero sentimental da minha parte — mas os conceitos criados nesse iceberg são até hoje explorados & expandidos por inúmeros fãs em fanfics, wikis, séries de analog horror no YouTube e mods para o jogo original. poucos trabalhos originais possuem a quantidade de criações derivadas que essa imagem possui
um dos grandes conceitos que esse universo expandido gira em torno é o da personalização. basicamente, Super Mario 64 possuía uma inteligência artificial que sabia o que você queria do jogo e te dava exatamente o que você precisava. ela era capaz de mudar completamente a geometria do castelo dependendo do modo que o jogador jogava o game, criar novas fases utilizando modelos já presentes no jogo ou exibir anomalias
de vez em quando uma cabeça flutuante do Wario poderia aparecer e te perseguir. de vez em quando, um Toad poderia ficar preso dentro das paredes e gritar por socorro. pessoas que jogavam as cópias personalizadas de Super Mario 64 tinham pesadelos iguais todas as noites. existe uma vila em Rainbow Cruise? talvez exista
e é incrível a obsessão desses fãs em tentar explicar os detalhes mais obscuros possíveis de Super Mario 64. detalhes que você até percebe enquanto joga, mas nunca realmente para e analisa o motivo dela estar ali. por que existem blocos empilhados no ponto mais alto de Lethal Lava Land? por que há estruturas misteriosas que parecem ter sido feitos por mãos humanas em Jolly Roger Bay? por que a skybox de Big Boo’s Haunt é tão sinistra? por que existe uma aura negativa em torno de Wet-Dry World? por que eu sinto medo?
na minha opinião, porém, o trabalho mais impressionante relacionado ao iceberg é o rom hack B3313 — que foi lançado em maio desse ano, quase três anos depois do boom de conteúdo original. B3313 é uma versão beta de Super Mario 64 que contém grande parte das personalizações possíveis — o que significa que ele possui mais de 300 áreas diferentes para explorar e mais de 400 estrelas para coletar. isso talvez seja um dos mais incríveis jogos de terror já existentes, principalmente para quem conhece o jogo original como a palma da mão — e para essas pessoas, qualquer mínima alteração na geometria e arquitetura do castelo e fases em geral é sentida. eu senti absolutamente tudo.
é inacreditável o jeito com que, apenas usando os modelos originais, se consegue criar uma atmosfera de terror sem igual. eu nunca joguei algo com uma atmosfera tão errada. qualquer porta que eu abro em B3313 é um evento: pode não ter nada de estranho ou pode ter tudo de estranho. uma bola gelatinosa feita de modelos destroçados do Toad ou só uma versão um pouco diferente de Whomp’s Fortress. pode ser um corredor normal ou o fogo pode te pegar
não importa o que você fizer, o fogo vai te pegar
uma torre, uma cabine telefônica e um shopping center
curtas-metragens de terror
talvez isso seja uma opinião impopular, mas eu acredito que terror é muito melhor quando é pequenininho. claro, um filme de uma hora e meia é perfeito se você quiser contar uma história atmosférica, meio lenta, que vai se tornando mais intensa durante essa duração — mas se você só quer que as pessoas vejam um monstro legal ou uns efeitos visuais mais experimentais, não tem motivo nenhum pra gastar tempo e dinheiro gravando um negócio longo. ninguém quer ver filmes compridos hoje em dia. nunca ouviu falar de TikTok? esse é o futuro do cinema. queira você ou não
tipo The Black Tower. uma das coisas mais assustadoras já feitas por um ser humano
é incrível o quão parecido com o terror atual de internet The Black Tower é: eu consigo perfeitamente ver uma série de analog horror fazendo um sucesso estrondoso com essa exata premissa, tal qual The Backrooms (Found Footage). mas que premissa é essa? uma pessoa acorda um dia e percebe que uma torre preta agora a segue por todos os lugares. não importa para onde você vá, o quão longe você caminhe, ela sempre estará lá — o que é a metáfora para depressão mais óbvia que já existiu, mas que não tira em nada o impacto do curta
o que realmente torna The Black Tower uma obra única é toda a montagem. a torre preta é vista sempre no horizonte, em takes longos nos quais a câmera praticamente não se mexe — quase como se fosse um slideshow ao invés de um curta-metragem, um filme em .ppt. a trilha sonora é quase inexistente: tudo que se escuta é a narração do protagonista, explicando em detalhes como está sua vida desde que a torre preta apareceu nela. e eu não sei se fica aparente quando eu descrevo essa obra desse jeito, mas tudo em The Black Tower é lindíssimo. é de uma beleza única. não existe quase nada que se parece com The Black Tower.
na verdade, La cabina me lembra um pouco
você sabe que uma obra de arte é boa quando ela impacta a população, e La cabina fez o uso de cabines telefônicas despencar na Espanha quando foi lançado em 1972. em La Cabina, um homem calvo e bigodudo fica preso dentro de uma cabine telefônica e coisas bem chatas começam a acontecer — esse é um filme do gênero putz, que merda, hein. por estar preso dentro dessa tal cabine telefônica, o homem deseja sair dela e poder novamente aproveitar as maravilhas do mundo tal qual uma pessoa normal — mas ele não consegue. esse homem está preso dentro de uma cabine telefônica
pessoas começam a se aglomerar em volta do homem. algumas tentam ajudar, mas a grande maioria apenas ri de toda a situação e parece não se importar. quem tenta ajudar rapidamente desiste; não tem o que o fazer. o homem está preso dentro da cabine telefônica. eventualmente, homens uniformizados aparecem e levam a cabine telefônica em cima de um caminhão. o resto eu não vou falar
grande parte do que faz La cabina uma obra tão especial é a falta de explicação para o que está acontecendo. em nenhum momento é falado ou mostrado porque o homem ficou preso nessa cabine telefônica: ele apenas ficou. foi uma casualidade. alguém precisava ficar preso, e ele só foi a pessoa que entrou lá primeiro. todo o sofrimento, o desespero desse homem, foi culpa única e exclusivamente do destino.
e o melhor de tudo é que isso foi produzido pela TV pública espanhola. vê se a TV Brasil já fez algo tão legal quanto isso em toda a sua história
e Possibly in Michigan é sim a melhor coisa já feita. gravado nas Lojas Renner do Farol Shopping, esse curta-metragem da artista Cecilia Condit se tornou uma das minhas obsessões da vida no momento em que encontrei ele no Reddit em algum momento misterioso & elusivo do ano de 2018 — e isso tudo pra dizer que eu o conhecia antes de ficar extremamente popular no TikTok. por favor, me achem legal, eu imploro
até é possível falar sobre a história de Possibly in Michigan, mas o que realmente faz esse filme ser tão impactante é o estilo. é uma trama sobre violência contada utilizando canções produzidas com um teclado Casio de baixa qualidade, sobreposições de imagens antagônicas e um homem vestido com uma máscara distorcida — em um mundo ideal, existiriam inúmeras fantasias de halloween desse personagem sendo vendidas em qualquer loja de fantasia no centro de São Ludgero/SC, mas o mundo está longe de ser uma utopia
mas meio que qualquer coisa que eu venha a falar sobre essa obra não será tão boa quanto ela é, então não adianta escrever muito. Possibly in Michigan é um trabalho super subversivo, altamente chique & refinado e surpreendentemente atual — pelo fato de homens de máscara parados no meio da rua ainda assustarem a maioria das pessoas na sociedade moderna
isa, não vou ter tempo de ver todos os curtas agora (só vi o Possibly in Michigan), mas né lembrei desse do Kleber Mendonça Filho chamado Vinil Verde que tem uma estética assustadora. Fica aí a dica
https://youtu.be/2aFMf46nwEo
Sobre Super Mario 64, eu queria dizer que sou de um mundo completamente diferente do seu - nasci próximo a megalópole São Paulo em 1991. Então eu vivi o lançamento desse jogo indo na casa de um amigo que me mostrou o que ele tinha acabado de comprar: lá estava o Mario correndo feliz pela Bob-omb Battlefield com música feliz e tudo. Eu fiquei muito impressionado de ver que agora ele fazia tudo igual antes, mas em 3D. Em dado momento eu ganhei um Nintendo 64 com o cartucho em questão. Daí foi a primeira vez que eu joguei sozinho. Foi assustador. Aquele silêncio que tem fora do castelo enquanto você explora seus primeiros movimentos, daí depois tu resolve entrar e a única coisa que tem é a música Inside the Castle Walls e uns Toads que existem sem existir simultaneamente. Eu só entendi que aquilo era pra ser um Castelo habitável quando joguei Paper Mario e representaram o mesmo lugar, mas com cômodos ao invés de quadros. Uau. Isso só piorou tudo. E nem falei da arquitetura das fases.
Eu infelizmente não consegui terminar de ler essa newsletter por conta da imagem da menininha no corredor. A criança cagona e que acredita em tudo ainda habita em mim hahahahah