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eu destruirei vocês #25: Coca-Cola com sabor abstrato
falando sobre a abertura de uma novela da Band que ninguém conhece, Fanta sabor angústia existencial, um álbum-conceito sobre Pepsi e a minha música favorita que eu nunca ouvi
um dos maiores retrocessos que aconteceram no Brasil nos últimos tempos pode ser visto de segunda a sexta no horário nobre da TV Globo. não, não é o notíciário político do Jornal Nacional1, mas sim as aberturas de novelas das 21h. em geral eu odeio o saudosismo, mas meu pai do céu, que saudade de Deus Nos Acuda. depois de Avenida Brasil, que mostrou que novela pode ser entretenimento e arte, as novelas das 21h passaram por um processo de serialização. agora elas são sérias, e agora elas parecem séries. não estou dizendo que isso é bom ou ruim, meio que é os dois, mas o quesito que mais sofreu depois que passaram a permitir falar a palavra merda em novelas foram as aberturas. hoje elas quase todas são parecidíssimas, pra não dizer iguais. uma abertura de novela das 21h da Globo na última década consiste em
imagens aleatórias de paisagens relacionadas à trama (drone sobrevoando Tocantins, drone sobrevoando o Pantanal)
pessoas fazendo atividades do cotidiano (pessoas caminhando, alguém subindo umas escadas, uma mulher abraçando uma criança, etc.)
uma montagem com várias imagens em close de algum objeto que tenha destaque na história (bolos, diamantes)
um cover de uma música dos anos 1980 ou 1990 cantado por um artista da atualidade
volta, Hans Donner, pelo amor de Deus. não só ele é responsável pela melhor camisa da história do Criciúma, ele também fazia umas aberturas de novelas em seu tempo vago, e de todas elas, a minha favorita tem que ser a de A Indomada (1997). é a melhor abertura de novela de todos os tempos. tem uma estética perfeita de anos 90 e parece um teste de animação 3D para ver como diferentes elementos da natureza funcionariam em computação gráfica. é um descanso de tela do Windows 98 em formato de abertura. e os autores da novela odiaram! as aberturas do Hans Donner usavam muito computação gráfica desde os anos 1980, quando a coisa mais interessante que dava pra fazer com computadores era criar um cubo. na de Selva de Pedra, a versão de 1986, não tem cubos, mas tem paralelepípedos. a abertura de Que Rei Sou Eu? parece uma alucinação, a de O Dono do Mundo é quase-experimental e a de Por Amor é maravilhosa, mesmo contendo doses mais do que as recomendáveis de Regina Duarte. e é tudo do Hans Donner, o único homem criativo do Brasil
a abertura de Torre de Babel, também do sr. Donner, é uma que, ao menos em mim, dá um sentimento ruim. eu acho que, se eu fosse criança quando essa novela passasse, eu ia morrer de medo dela. meio que só mostra a tal torre, que é de Babel, de vários ângulos enquanto uma música meio sinistra toca no fundo. é um sentimento parecido com o que eu sinto com a de Serras Azuis, novela da Band de 1998 que ninguém no mundo já ouviu falar, mas cuja abertura tem uma sequência de imagens quase em preto e branco que me dão um pouco de medo. mas a abertura de novela mais assustadora de todos os tempos só pode ser a de Sinal de Alerta, novela das 22h de 1979. ela simplesmente não tem música, só efeitos sonoros. só pela descrição não parece tão horrível assim, mas fica com uma vibe horrorosa, como se eu estivesse assistindo a fita de O Chamado. eu não consegui prestar atenção na mensagem anti-poluição da abertura porque eu tive que ir me esconder atrás do sofá quando vi isso. imagina ter que ver isso passando todo dia na televisão às 22h. desumano
você deve estar pensando “tá, Isabela. se você gosta tanto de aberturas de novelas, por que não faz um top 10 com suas aberturas favoritas?”
porque eu não quero, oras
finalmente um drink para os gamers
a nova Coca-Cola sabor byte
boas notícias para todos os gamers do Brasil: depois de anos consumindo só Monster, agora você pode beber refrigerante. a Coca-Cola, empresa que produz Coca-Cola, lançou no mercado recentemente uma Coca-Cola sabor byte. é, é sabor byte mesmo, tá até escrito na embalagem. não é meme, não é bait, não é tankável. eles simplesmente lançaram uma Coca-Cola com sabor abstrato. pelo amor de Deus, byte não tem sabor. não dá pra beber um byte. não é um refrigerante de limão ou de guaraná, é um refrigerante de um conceito. daqui a pouco eles vão lançar um Kuat sabor torcida do Flamengo ou uma Fanta sabor angústia existencial. isso foi criado pra quem já jogou um Super Mario World e pensou “ah, legal esse jogo, mas eu queria mesmo era sentir o gosto de um byte. eu quero beber um pixel. eu quero esse game na minha boca AGORA”. só acredito que colocar um cartucho de Super Nintendo na boca deve ser mais saudável que a Coca-Cola sabor byte
mas a questão que todos estão se perguntando é: essa Coca-Cola tem sabor de byte? ah. depende de vários fatores internos e externos. primeiro que ela é sem açúcar, o que eu acho que já tira um pouco a byteza dela. não sei vocês, mas quando eu penso games, eu penso açúcar, eu penso gordura, eu penso um Mountain Dew, uma bala de goma da Dori, uma mão cheia de farelo de Doritos. e isso se soma ao fato de que eu odeio refrigerantes sem açúcar e essa coquinha aí já começou mal. pra mim, isso aqui tem gosto principalmente de adoçante, com um quê de sabor misterioso. eu e a Bruna tentamos desvendar qual era até que ela chegou à conclusão de que era cereja, o que eu concordo. mas assim, só o retrogosto é de cereja. enquanto você bebe, não vai sentir nada de cereja. e eu não faço isso ideia se isso é psicológico ou não, mas eu senti um quê de Pop Rocks, aqueles doces de pedrinha que estouram na boca. talvez seja psicológico porque tipo… você esperaria algo assim de um sabor byte, não esperaria? que ele fosse meio quadrado e explodisse na boca? ou eu que sou completamente doida? favor não responder. em geral, qual a minha nota? hm… 4/10. o problema maior é a falta de açúcar. já a Bruna não quis assimilar uma nota númerica a esse produto, mas seu review foi
Eu tomaria se fosse a última opção de refrigerante do mundo.
eu acho que eu também. acho
odeio refrigerante
o álbum Negativland – Dispepsi (1997)
eu sou uma pessoa que acredita que uma das coisas mais importantes em qualquer obra de arte é o quão engraçada ela é. e eu não estou falando de engraçado no sentido de um divertido stand-up do humorista Murilo Couto, eu estou dizendo mais de o quão engraçado o conceito é. o Duchamp expondo um mictório numa galeria de arte, por exemplo, pra mim é engraçadíssimo, o Andy Warhol gravando o Empire State do mesmo ângulo por 8 horas seguidas é muito melhor do que A Sogra Que Te Pariu, e o Negativland, banda/coletivo experimental norte-americano, tentando lançar um EP chamado U2 em que a capa mostra praticamente só o nome da banda U2 e a música consiste em versões péssimas de karaokê de I Still Haven't Found What I'm Looking For não só é o suprassumo da arte como também extremamente engraçado
o Negativland obviamente foi processado pela gravadora do U2 depois disso aí, mas por Dispepsi, álbum de 1997, eles incrivelmente não foram processados. o segundo álbum-conceito sobre uma marca de refrigerante da história (depois do disco do Dazaranha de 1994 sobre Laranjinha Água da Serra) Dispepsi é uma crítica não só à Pepsi, mas contra Coca-Cola, Mountain Dew, Fruki e a forma que essas empresas promovem seus produtos na mídia. é basicamente uma análise cultural em forma de álbum. o Negativland adora usar samples de qualquer coisa nas músicas deles, e a maior parte das músicas em Dispepsi é formada praticamente só de samples de comerciais antigos da Pepsi, num lance meio capitalismo-distópico-é-impossível-o-futuro-ser-bom. isso é música eletrônica pra pensar. é uma colagem musical. é EDM. entelligent dance music
mas calma, se você é como eu e odeia pensar em qualquer coisa, tem algumas músicas de verdade nesse álbum também. Drink It Up entra totalmente numa vibe distópica, como se o narrador estivesse te forçando a tomar uma Pepsi, em um tom meio ditadorial. é uma música pra soldado marchar, um hino nacionalista do país Pepsi. Happy Hero é uma faixa que eu não acredito que não ser uma música do Ween em todos os sentidos. é uma música ultra-irônica sobre como marcas de refrigerante usam garotos-propaganda para mascarar crimes não só das marcas mas também dos garotos-propaganda, e eu juro que a música é muito mais legal do que essa chatíssima descrição dela. e Aluminum or Glass: The Memo tem uma das melhores letras que eu já vi. ouvi. li. sem contar que o clipe é o puro suco do caos da animação 3D de 2004. eu já botei o link pro clipe aí, é só voltar duas linhas
depois desse álbum, eu nunca mais vou beber Pepsi. eu já não bebia antes, mas agora não vou beber mais ainda
coisas que nunca terei
a música mais linda que eu nunca ouvi
há uns meses, eu estava passivamente lendo a minha timeline do Twitter como faço com frequência quando vi um tweet do @ricapancita falando sobre uma suposta música lindíssima. cliquei, escutei, e putz. pior que é mesmo, hein. Aldebaran, cantada por Bonifrate, tem seis minutos de duração, a melodia praticamente não progride, é quase toda acústica e também é uma das coisas mais lindas que eu já escutei. é um negócio meio Mount Eerie, uma repetição contínua de uma mesma melodia, uma música que poderia durar seis horas que eu não reclamaria. ela te hipnotiza. as harmonias no final dos versos são sublimes e tem uma vibe um pouco pop dos anos 1960, algo produzido pelo Phil Spector. o único problema é que isso aqui é um cover de uma outra música, e a versão original não está em lugar nenhum da internet
segundo o tweet do Rica Pancita, essa era originalmente uma música da banda carioca Filme, e a descrição do upload oficial do cover no YouTube diz que foi escrita por Simplício Neto e Fred Coelho, os dois membros da banda Filme. faz sentido! mas eu não consegui encontrar ela em lugar nenhum. talvez o motivo de eu não ter encontrado seja porque Filme é o nome mais genérico possível para uma banda, a ponto de nem se eu procurar banda filme rio de janeiro eu encontrar alguma coisa sobre ela. segundo o Bonifrate, que tem conexões com os membros da Filme, é possível que nem os próprios membros da banda tenham os arquivos mais. eu procurei nos arquivos do Trama Virtual, no last.fm, no MySpace e até no mp3.com mas não encontrei absolutamente nada, nem um sinal de vida dessa música. tudo que eu sei é que deve ser muito boa, mas eu não tenho como saber. e isso me deixa LOUCA
eu acho que, na minha lista pessoal de lost media que eu mais gostaria de encontrar, isso estaria lá no topo. junto com Miguelito, a cópia brasileira do Chaves que passou na RedeTV!
ai, que saco. tudo bem, já que vocês pediram eu faço
top 10 melhores aberturas de novelas da história
10. Geração Brasil → ilustra perfeitamente o otimismo de um Brasil pré-7 a 1
9. Por Amor → meio peeeeer amooooreee das ideias
8. O Tempo Não Para → quando o vaporwave chegou no horário nobre
7. A Favorita → a definição da palavra icônica
6. O Rei do Gado → aprende a fazer uma abertura rural decente, Pantanal (2022)
5. Cama de Gato → eu quero morar no Universo de Cordas
4. Verão 90 → única abertura de novela com uma referência a Nirvana
3. Esplendor → a beleza da simplicidade. literalmente me deixa emocionada
2. Deus Nos Acuda → odeio rico
1. A Indomada → ARTE
CRÍTICA SOCIAL!!!!!!!!!!!!
eu destruirei vocês #25: Coca-Cola com sabor abstrato
fanta sabor angustia existencial é só uma fanta normal
chegaram a ter duas aberturas (ou mais, não sei bem. pelo menos duas) de torre de babel né? na segunda tentaram dar uma disfarçada nesse SCP nacional com a Gal https://youtu.be/HTlFmNnhYqo
ver uma seção sobre negativland semanas depois dessa newsletter me fazer conhecer negativland direito indiretamente foi engraçado. uma sonzeira sem tamanho essa aluminum or glass
e muito boa essa aldebaran!!! se alguma hora aparecer registro da banda filme dá um update aqui